Os dois Pastores.

David Santos

Existiam dois rebanhos, um era disperso e barulhento, outro era coeso, silencioso, obediente e atencioso. Cada rebanho tinha seu pastor. O primeiro era barulhento, criava sinais para conter as ovelhas que vigiava. As dominava pelo medo, pela dor. O segundo pastor, mudo e surdo de nascença, não tinha poder para gritar, não tinha palavras para amedrontar. Cuidava das ovelhas e as indicava, com toda sua simplicidade, o caminho a seguir. Como sinais trazia o brilho de seus olhos e a delicadeza de seus lábios áridos de palavras e ricos de alegria.
O primeiro pastor construiu uma grande fornalha. Lá prometia lançar todas as ovelhas que se desagarrassem. Todos os dias em um ritual sangrento, sacrificava um cordeiro, gritava que o sacrifício desse cordeiro era para retratar os erros do rebanho, por mínimo que eram. Com medo e gemidos de dor as ovelhas baliam de medo.
O segundo pastor não construía fornalha, não precisava amedrontar. Possuía um olhar umedecido de amor, lábios ressequidos de palavras, mas indicadores de paz de onde brotava um sorriso consolador. No lugar da fornalha possuía uma lareira, onde colocava para aquecer as ovelhas que haviam se perdido, as que reencontrou. Ali as tratava e curava. Não diferenciava as bravas, das mansas, as manchadas e as sem mancha, para ele todas eram iguais, todas eram amadas. De seu corpo emanava: calor é de amor, amor de pai, amor de mãe, amor de cuidador, de cuidadora.
Todo seu dia era um ritual e os olhos de seu rebanho fitavam o sacrifício diário que ele fazia. Esse não matava simplesmente o cordeiro para impor medo aos outros cordeiros. Anunciava pelo sacrifício do cordeiro sem mancha a ressurreição, a salvação, o amor de criador, de mantenedor da vida. Essas ovelhas num manso balir, de tão manso que era, produziam um canto de louvor e admiração, a voz que não emanava da boca do bom pastor, emanava no balir daquele rebanho diverso e conciso.
Não é pelo medo, não são pelos sinais, não é pela dor e pelo sacrifício que se transparece o salvador. A simplicidade e o silêncio, talvez sejam necessárias para a compreensão do verdadeiro sentido, da verdade revelada. Que 2014 seja guiado pelo Pastor Misericordioso, que possamos como dizia Santo Inácio, como bem administrava nos Exercícios Espirituais São Pedro Fabro, sentir e saborear as coisa internamente.


Feliz 2014, que seja um ano repleto de graças, repleto de paz, de saúde e compreensão.

Comentários

Postagens mais visitadas