Imaginação



Imagino uma criança síria diante de toda complexidade do sistema que a cerca, ainda sem compreender as ferramentas de especulação que giram em torno de si. Não conhece as regras de mercado, como funciona a economia mundial e talvez nunca ouviu dizer sobre aquilo que dizem ser os Direitos Universais do Ser Humano, claro, se efetivamente o ser humano tiver algum direito universal.
A única coisa que essa criança sabe é que em seu país há um conflito anterior a ela. Já nasceu naquele cenário horrível de guerra. Em conjunturas semelhantes, nascem também muitos latinos americanos, norte americanos, europeus, africanos, asiáticos, crianças da Oceania. Crianças que nascem observando a barbárie de sua espécie. Nas batalhas urbanas, quase que ocultas, aos olhos dos defensores dos ditos direitos humanos. De quem não pode cruzar seus braços, pois se os cruza, não alcança as armas que carrega consigo para amedrontar as crianças que já nascem oprimidas pela barbárie daquilo que são e virão a ser.
Essa criança síria não sofre a mesma pressão que sofre, por exemplo, uma criança brasileira. A brasileira tem medo do ladrão, do assassino que ronda sua porta, do desemprego de seu mantenedor, de ficar doente já que em alguns lugares nem médico tem, ou do vizinho que tem como profissão correr das ferramentas que o governo utiliza para manter a “ordem”. E isso por que no Brasil “não existe ninguém” lutando contra o regime político. Aqui já temos democracia, Coca-Cola, Mac Donald. A vermelhidão do desejo democrático já nos invadiu.
Essa criança síria ainda não deve conhecer a vermelhidão democrática, seus desejos ainda não foram despertos, pois nasceu no medo, não tem o direito de passear nos belíssimos corredores iluminados de um Shopping. Não corre nos corredores chorando para poder consumir, corre das forças revolucionárias e das ferramentas que a “ditadura” utiliza para controlar a revolução. Agora essa criança já deve saber que outro inimigo a espreita, um inimigo que tem mais poder, mais armas, mais dinheiro e que descruza os braços para poder alcançar suas armas de destruição.
Essa nova ameaça está horrorizada pela morte de crianças, pelo uso de armas químicas. Ela tem que ensinar ao mundo que não se devem utilizar armas químicas, que a humanidade sofre por isso. E essa ameaça tem toda a autoridade para isso, já conhece o efeito de tais armas, pois já as jogou sobre crianças no Vietnã e já lançou piores no Japão.
Imagino uma criança síria que em sua pequena cabeça corre de medo de tudo isso, não importa de qual lado esteja essa criança, agora ela corre mais risco. Não tenho como imaginar como ela se sente, mas sei, por já ter sido criança, que o medo dói e gera feridas. Feridas que no futuro podem gerar um adulto que amedrontará outras crianças, que sustentará um regime menos opressor. Quem sabe, as futuras crianças sírias terão como outras no mundo um Shopping para poder correr, terão dia das crianças, dia das mães, dos pais, dias de consumir e movimentar a economia que desconhecem.

E se eu fosse, uma criança síria, como estaria agora meu coração?

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